domingo, 27 de janeiro de 2013

O Sonho Do Ministro Joaquim Barbosa Pode Virar Pesadelo


Joaquim Barbosa se tornou o primeiro ministro

negro do STF como decorrência do extraordinário

currículo profissional e acadêmico, da sua

carreira e bela história de superação pessoal.

Todavia, jamais teria se tornado ministro se o

Brasil não tivesse eleito, em 2003, um Presidente

da República convicto que a composição da

Suprema Corte precisaria representar a mistura

étnica do povo brasileiro.

Com certeza, desde a proclamação da República e

reestruturação do STF, existiram centenas, talvez

milhares de homens e mulheres negras com

currículo e história tão ou mais brilhantes do

que a do ministro Barbosa.

Contudo, nunca passou pela cabeça dos

presidentes da República – todos oriundos ou a

serviço das oligarquias herdeiras do escravismo –

a possibilidade de indicar um jurista negro para

aquela Corte. Foi necessário um governo de

esquerda, com todos os compromissos inerentes

à esquerda verdadeira, para que seu mérito fosse

reconhecido.

A despeito disso, o ministro Barbosa, em

uníssono com o Procurador Geral da República,

considera não haver necessidade de provas para

condenar os réus da Ação Penal 470.

Solidariza-se com as posições conservadoras e

evidentemente ideológicas de alguns dos demais

ministros e, em diversas ocasiões procura ser

“mais realista do que o próprio rei”.

Cumpre exatamente o roteiro escrito pela grande

mídia ao optar por condenar não uma prática

criminosa, mas um partido e um governo de

esquerda em um julgamento escandalosamente

político, que despreza a presunção de inocência

dos réus, do instituto do contraditório e a falta

de provas, como explicitamente já manifestaram

mais de um dos integrantes daquela Corte.

Por causa “desses serviços prestados” é alçado

aos céus pela mesma mídia que, faz uma década,

milita contra todas as iniciativas promotoras da

inclusão social protagonizadas por aquele

governo, inclusive e principalmente, àquelas que

tentam reparar as conseqüências de 350 anos de

escravidão e mais de um século de discriminação

racial no nosso país.

O ministro vive agora o sonho da inclusão plena,

do poder de fato, da capacidade de fazer valer a

sua vontade. Vive o sonho da aceitação total e do

consenso pátrio, pois foi transformado pela

mídia em um semideus, que “brandindo o cajado

da lei, pune os poderosos”.

Não há como saber se a maximização do sonho

do ministro Joaquim Barbosa é entrar para a

história como um juiz implacável, como o mais

duro presidente do STF ou como o primeiro

presidente da República negro, como já

alardeiam, nas redes sociais e conversas

informais, alguns ingênuos, apressados e

“desideologizados” militantes do movimento

negro.

O fato é que o seu sonho é curto e a duração não

ultrapassará a quantidade de tempo que as elites

considerarem necessário para desconstruir um

governo e um ex-presidente que lhes incomoda

profundamente.

 Elaborar o maior programa de transferência de

renda do mundo, construir mais de um milhão de

moradias populares, criar 15 milhões de

empregos, quase triplicar o salário mínimo e

incluir no mercado de consumo 40 milhões de

pessoas, que segundo pesquisas recentes é

composto de 80% de negros, é imperdoável para

os herdeiros da Casa Grande. Contar com um

ministro negro no Supremo Tribunal Federal para

promover a condenação daquele governo é a

solução ideal para as elites, que tentam

transformá-lo em instrumento para alcançarem

seus objetivos.

O sonho de Joaquim Barbosa e a obsessão em

demonstrar que incorporou, na íntegra, as bases

ideológicas conservadoras daquele tribunal e dos

setores da sociedade que ainda detém o “poder

por trás do poder” está levando-o a atropelar

regras básicas do direito, em consonância com os

demais ministros, comprometidos com a

manutenção de uma sociedade excludente, onde

a Justiça é aplicada de maneira discricionária.

A aproximação com estes setores e o

distanciamento dos segmentos a quem sua

presença no Supremo orgulha e serve de

exemplo, contribuirão para transformar seu

sonho em pesadelo, quando àqueles que o

promoveram à condição de herói protagonizarem

sua queda, no momento que não for mais útil aos

interesses dos defensores do “apartheid social e

étnico” que ainda persiste no país.

Certamente não encontrará apoio e solidariedade

nos meios de esquerda, que são a origem e razão

de ser daquele que, na Presidência da República,

homologou sua justa ascensão à instância

máxima do Poder Judiciário. Dos trabalhadores

das fábricas e dos campos, dos moradores das

periferias e dos rincões do norte e nordeste, das

mulheres e da juventude, diretamente

beneficiados pelas políticas do governo que

agora é atingido injustamente pela postura

draconiana do ministro, não receberá o apoio e o

axé que todos nós negros – sem exceção –

necessitamos para sobreviver nessa sociedade

marcadamente racista.

Ramatis Jacino é professor, mestre e doutorando

em História Econômica pela USP e  presidente do

INSPIR – Instituto Sindical Interamericano pela

Igualdade Racial.

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